sexta-feira, 1 de maio de 2009

UM BREVE ADEUS


Hoje, por um rápido-efêmero momento, minha mãe, ao sentir minha aproximação e identificar, na confusão mental em que estava mergulhada, aquela voz há tempos familiar, há tempos simbolizando ventre, entranhas, amor incondicional, a filha gerada e tão esperada, abriu-me um sorriso e por, fração de segundos, senti um fio de vida em seu olhar há tempos distante, sem foco, vazio, triste... tão triste de dar dó. Senti-me recompensada, pois já não a ouço falar, sequer tenho a correspondência de seu olhar ou sinto seus olhos em minha direção. Mas que direção? Nem sua vida conseguia mais conduzir. Ainda que apele aos santos, fale aos seus ouvidos palavras de efeito, chame o seu nome... nada consigo. Assim, aquele sorriso furtivo, sem intenção específica foi o máximo!
Acaricio o seu corpo sofrido, frágil, esquálido, faço-lhe alguns curativos nas feridas que insistem em deixar suas marcas, beijo-lhe a testa, como a dizer: estou aqui, confie, não vá agora; sou eu, sua filha querida. Mais uma vez o silêncio foi mais forte e não obtive qualquer correspondência ou gesto que pudesse reconfortar o meu inquieto coração, tão oprimido, há tempos sem a paz necessária para viver dias felizes.
A cena choca-me: fios, aparelhos, sondas, invasões cada vez mais dolorosas e agressivas num corpo que só precisa descansar. E só precisando descansar, por que teima em resisitir, por que deixa-se invadir e ferir-se cada vez mais? Qual será ainda o seu compromisso por aqui? Que fio tênue liga-a a esse mundo?
Sigo, acariciando aquele corpo semi-morto e cobrando da vida algumas respostas impossíveis no plano real. Na transmutação de energia, queria-lhe amenizar as dores, mas não sou tão poderosa assim. Nestas ocasiões quisera ser, mas definitivamente não sou. Dilacero-me, fragilizo-me, volto ao meu papel de acompanhante, mas não sem antes chora r copiosamente. Os meus olhos mais uma vez buscam os seus, na esperança de encntrá-los, mas não mais os encontro. Voltou para o seu mundo alienante. Volto a chorar então mas com um sabor de revolta; lamento que a sua vida tenha tomado um rumo tão triste, tão alheio às coisas que acontecem a sua volta. Afinal, o melhor da velhice é poder contar causos e até isso lhe foi negad0.? Triste, não? Maldisse a religião, que, por tanto tempo foi seu alicerce, seu tempo itegral de dedicação. Falta-lhe à cabeceria pessoas que peguem em suas mãos e entoem os cânticos que senpre lhe serviram de cantilena para encher seu coração de alegria. Por onde estará o PAI, que não vem em socorro de sua filha? Abandonou-a á luz de sua própria sorte? Deixou-a só e desamparada? Estas questões inquietam-me a alma, criam um abismo entren o racional e o pasional que povoam nosso corações e inquietam a nossa essência.
Separo-me dela já com a bolsa na mão, despeço-me sussurrando a palavra AMOR e outras palavras de efeito para que não se esqueça jamais do quanto foi importante em ninha vida. Alcanço a porta de saída e comporto-me como alguém que ainda espera rever aquele sorriso tão rápido mas tão significativo dentro daquele universo nonsense, Volto mais uma vez para vê-la de perto, beijar-lhe carinhosamente a testa e dizer-lhe: - Mãezinha, até amanhã ou até qualquer hora.

3 comentários:

Heitor Achilles disse...

Viver,sobreviver, respirar...

Em sua confusão mental, a personagem não tem consciência do que de fato está a sua volta.

Mas consciência de quÊ?

A sua ou a nossa volta... Aliás, o que temos?

Temos aqueles que por limitações de saúde, diante de todo sofrimento, sobrevivem inconscientemente e esperam uma solução pré-anunciada.

Mas também temos outros... os saudáveis, sobreviventes conscientes, sem a perspectiva de ter uma solução, sequer, pré-anunciada.

Difícil mesmo saber quem são "aqueles" e quem são os "outros".

Enquanto há tempo, realidades locais se misturam e proporcionalmente permanecem entregues ao acaso.

E assim conspira o nosso "universo nonsense" apenas para perpetuar o dia nosso de cada dia.

Luciene disse...

É... Adeus!!!!
Um breve Adeus...
Consciência... Inconsciência...
Quem é o "ser" consciente... Quem será o "ser" inconsciente????
Penso...
Ninguém sabe.
Talvez...
O último sorriso... Ficará para sempre.
O cheiro... A saudade!!!!
Saudade imaculada de momentos... Inesquecíveis.
Momentos vividos perfeitos ou não... Mas NOSSOS momentos!!!!
O AMOR... Que nos uniu um dia e talvez nos unirá... DEUS saberá... Só Ele.

Luciene disse...
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